Jamais esqueci o que falou certa vez o professor Leopoldo
Justino Girardi, que me deu aula de Filosofia na PUC/RS no segundo semestre de 1979
e no primeiro de 1980. Peço desculpas ao mestre se não lembrar suas palavras
exatas. Ou se, de alguma forma, distorcer o que foi dito. Mas mas foi mais ou menos isto: "O entendimento de Deus é como um oceano. A capacidade
de entendimento do ser humano é como um copo. Não se coloca um oceano inteiro
num copo, apenas parte dele". Ou seja: o entendimento de Deus por parte do
homem será sempre limitado. Nunca teremos uma compreensão plena de Deus.
É claro que essa argumentação tem um lado cômodo, pois
libera o crente da obrigação de explicar por que acredita em Deus, de
apresentar uma justificativa sólida. Mas fé é isto mesmo, é crer em algo que não
se consegue entender plenamente.
Acho curioso que muitos ateus se sentem agredidos pela mera
menção de Deus. Noto isso principalmente no Facebook. E reagem das mais
diversas formas, que vão da contundência ao deboche. Certo amigo leu meu livro
em primeira mão e me sugeriu tirar a citação a Deus que coloquei ao final da
seção de agradecimentos, pois poderia afugentar os descrentes. Respondi que
correria o risco. Talvez nem todos percebam que falar em Deus, por si só, não
significa querer impô-LO ou iniciar um trabalho de conversão.
Escrevi tudo isso para chegar neste ponto: praticamente
todos que, por algum motivo, deixaram de embarcar no avião da Voepass que caiu
no interior de São Paulo, estão dando graças a Deus. Estão dizendo que foi Deus
que as impediu de morrer naquele dia. E os ateus, claro, estão tripudiando.
É normal quem tem fé atribuir a Deus todas as coisas boas
que lhe acontecem. Os salvamentos, os livramentos, as situações em que, por
pouco, escapa-se de uma tragédia. Os crentes chamam a isso de bênçãos.
Certa
tarde, enquanto ainda estava casado, andava de carro com minha esposa pelo
bairro Ipanema, em Porto Alegre. Eu não conhecia bem as ruas, mas pensei ter
dado um retorno de forma correta e julguei estar novamente na via principal, desta
vez no sentido oposto, que nos levaria de volta para casa. De repente, pouco
antes de eu chegar a uma esquina, outro automóvel passou na perpendicular em
alta velocidade. Naquela fração de segundo, percebi que eu não estava na rua em
que pensava estar. Supondo que dirigisse pela preferencial, iria passar por
aquela rua direto, sem me preocupar. Se eu tivesse chegado ao cruzamento alguns
segundos mais cedo, aquele carro teria me colhido em cheio, com consequências
imprevisíveis. Em vez disso, com cuidado, dobrei à direita e, aí, sim, estava
no caminho correto. Até hoje digo que foi Deus que colocou aquele carro ali, no
momento certo, para me avisar que eu não estava na via preferencial.
Por outro lado, como explicar os dois casos que já aconteceram
em Porto Alegre de pessoas que morreram porque uma marquise caiu sobre elas bem
na hora em que passavam por baixo? Foi Deus que quis assim? Realmente, fé é
algo complicado. É acreditar no que não se consegue entender plenamente, bem
como definiu o Professor Girardi.
Sobre o acidente aéreo, os ateus ironizam, dizendo que Deus
salvou alguns e não outros. Não vou tentar explicar nada. Apenas digo que, se
eu estivesse com passagem marcada para aquele avião e não conseguisse embarcar,
com certeza agradeceria a Deus eternamente. Por isso entendo e não critico.
Cada vez mais vejo o que costumo chamar de "ateus
praticantes". São aqueles, por exemplo, que quando falo em Deus no
Facebook, me respondem curto e grosso: "Deus não existe". Como se
estivessem me trazendo uma informação preciosa e esclarecedora, que fosse mudar
minha vida. Acho uma atitude grosseira e desrespeitosa.
Não tento impor a fé a ninguém. Mas respeitem a minha.