domingo, maio 11, 2025

Dia das Mães

Minha mãe tinha uma visão cor-de-rosa da vida. Não era ingênua, conhecia as maldades e as dificuldades do mundo, mas acreditava em final feliz. Pensava ser possível resolver os problemas com um sorriso ou uma frase de efeito. Vivia falando no tal do "jogo do contente" da Polyanna  e com isso se tornava, às vezes, um tanto conformada. Afinal, como ela sempre dizia, "mais tem Deus para dar do que o diabo para tirar".
Era uma pessoa sorridente, de bem com a vida e muito amorosa. Formada em Odontologia, ela levava esse carinho para a profissão. Orgulhava-se em contar dos pacientes que a elogiavam, dizendo que o bom humor dela fazia até perder o "medo de dentista". Mas, no dia-a-dia, não fazia questão que a chamassem de "doutora". Fora do consultório, ela era a Dona Irene com que todos simpatizavam.

Quando lia algum texto em voz alta, chegava a exagerar na ênfase, valorizando cada palavra. Gostava que lhe tirassem fios de cabelo branco, dizia que a sensação era agradável e terapêutica. Se estava levemente tensa ou preocupada com alguma coisa, assobiava uma sequência de notas que eu já sabia de cor, embora não identificasse a música. Um dia ela me disse qual era, mas eu não conhecia. Sabiamente, ela me avisou: "cuidado com a mãe, quando ela está assobiando!"  

Mesmo com seus compromissos profissionais, ela sempre fez questão de trabalhar no mesmo horário em que eu tinha aula, para poder estar em casa comigo e acompanhar meus estudos. Por um bom tempo ela participou das atividades do Clube de Mães do colégio Paula Soares, que ajudou a fundar e do qual foi a presidente. A presença dela era tão constante que uma de minhas colegas a chamava de "professora". Isso, infelizmente, não durou muito. Mesmo antes de ter um enfarte em 1977, ela começou a se acomodar e ficar mais caseira. No meu tempo de Pio XII ela já não comparecia às festas de Dia das Mães que a escola organizava.  

De 1970 a 1978, ela teve um companheiro inseparável: o cocker spaniel Rocky, que a acompanhava como uma sombra. Quando ouvíamos o barulho das patas de unhas compridas saindo do quarto, sabíamos que ela vinha junto. O cachorro a protegia incondicionalmente. Mesmo depois que ele se foi, por muito tempo eu ainda me aproximava com cuidado da cama dela, para não ser surpreendido por uma mordida no pé do seu "protetor" canino.

 Apesar do carinho imenso que tínhamos um pelo outro, o diálogo nem sempre fluía bem. Lembro de quando a visitei na UTI em 1977, na ocasião do citado enfarte que nos deu um susto. Como ela só podia receber uma visita de cada vez, ficamos eu e ela sozinhos e eu sem saber o que dizer. Felizmente, isso mudou. Nos últimos anos de vida dela eu já não me inibia de conversar com ela com naturalidade. Ficamos mais próximos em termos de comunicação. Ela nunca conseguiu me enxergar como um adulto, mas pelo menos já me entendia melhor. E assim eu me sentia mais à vontade para falar das minhas coisas.  

Quando ela faleceu em 1989, senti que havia uma cobrança de minha família para que eu chorasse. Todos estavam firmes, mas eu, por ser o filho mais moço, só podia estar me reprimindo, dentro daquela premissa machista de que "homem não chora". Depois todos conseguiram entender que eu sentia o mesmo que eles: alívio por ela ter partido sem sofrimento, já que sabíamos que ela tinha câncer, mas principalmente gratidão por ela ter ido com a missão mais do que cumprida. Ela nos deu muito amor e isso não morreu nunca. Está dentro de cada um de nós. É claro que, na hora do sepultamento, as lágrimas vieram. E eu sabia que, em algum momento, elas iriam voltar.  

Certa tarde eu estava em minha casa ouvindo o CD "A Arte de Caetano Veloso". De repente, veio aquela melodia que eu conhecia desde a infância: "Quero ver Irene rir, quero ver Irene dar sua risada... Irene ri, Irene ri, Irene ri..." E aí fui eu que chorei convulsivamente. 

Mas é bom saber que a Dona Irene deve estar dando o seu sorriso lá no Céu, junto do meu pai, a quem ela devotou um amor eterno e incondicional, e da mãe dela, a minha vó. Ah, sim, e do meu irmão, também, o Cau. E da Celina, que também continua cuidando deles e de todos nós.  

Mãe, um beijo e obrigado por tudo. Feliz Dia das Mães!

(Postagem original de 2012.)

quinta-feira, maio 01, 2025

Luiz Antônio Mello

Faleceu ontem, aos 70 anos, Luiz Antônio Mello, de Niterói-RJ, criador da lendária Fluminense FM. Não o conhecia pessoalmente, mas tive a honra de tê-lo como colega nas páginas do International Magazine. Neste site aqui, ele lembrou os tempos em que colaborou para o saudoso jornal de música. Em 3 de março de 2015, ele me mandou o seguinte recado por Messenger:

Emílio, tudo bem? Estou trabalhando numa série de TV sobre rock brasileiro. Vão ser 13 episódios no Canal Brasil. Queremos entrevistar você sobre rock de POA ontem e hoje. Mais: lista de quem é quem no rock daí. Músicos, radialistas, etc. Pode ser? Vamos a POA gravar. Meu email é...
Indiquei vários nomes que foram entrevistados, como Zeca Azevedo, Juarez Fonseca, Rogério Ratner, Arthur de Faria e Léo Felipe. O resultado foi a série "A Trilha do Rock no Brasil", que apresentou seu primeiro episódio no dia 21 de outubro de 2016, depois teve algumas reprises. LAM, como também era conhecido, parte com sua missão cumprida.

terça-feira, abril 22, 2025

Outro empate com gosto de vitória

Em minha postagem anterior, comentei que, nos jogos do Internacional que terminavam 1 a 1, se o Colorado tivesse feito o gol de empate, eu considerava meia vitória. Foi o que aconteceu no Grenal. Pois hoje foi melhor ainda: o Inter buscou o empate contra o Nacional de Montevidéu depois de estar perdendo por 3 a 0. Que eu lembre, isso nunca aconteceu no meu tempo de torcedor fanático, no começo dos anos 1970, embora eu mantivesse a esperança até o fim. 

domingo, abril 20, 2025

Empate no Grenal

No meu tempo de colorado fanático, eu considerava um resultado de 1 a 1 como meia vitória ou meia derrota, dependendo de quem fizesse o gol primeiro. Se o adversário começasse ganhando e o Inter igualasse o placar, era meia vitória. Eu comemorava. Por outro lado, se o Inter iniciasse vencendo e cedesse o empate, era meia derrota. Eu lamentava. Então ontem foi um dia de copo meio cheio.

Quanto ao pênalti que o juiz não marcou... Acho que deveria ter marcado. Mesmo desfavorecendo o meu time.

E Feliz Páscoa a todos!

terça-feira, abril 15, 2025

Slide


No sábado, postei o seguinte comentário no Facebook:

Já que o público consumidor conseguiu aposentar a verdadeira maravilha que é o CD, com todas as suas vantagens e avanços tecnológicos, e trazer de volta o incômodo, frágil e problemático vinil, então eu também quero a volta do Super-8, filme 16mm e slides. Desses eu realmente gostava e lamentei quando desapareceram. Principalmente o slide.

Seguiram-se respostas diversas sobre CD, vinil e assuntos correlatos. Mas um amigo observou que eu deveria digitalizar meus filmes e slides o quanto antes, pois poderiam desbotar ou mofar. Neste ano não sei se será possível, mas já está nos meus planos comprar um bom digitalizador de diapositivos. Tenho muito material para disponibilizar. Mas, motivado pela recomendação dele, resolvi dar uma espiada nos meus slides. Peguei a pilha que estava mais à mão. Encontrei esta foto do meu filho que eu nem lembrava de ter tirado. Aqui eu usei uma simples lâmpada por trás para iluminá-la.

Sobre sessão de slides, leiam o que eu escrevi aqui.

domingo, abril 13, 2025

Os 50 anos de "Loki?" - agora, sim!

Neste ano de 2025, comemoram-se os 50 anos do LP "Loki?", antológico trabalho solo do Mutante Arnaldo Baptista. No entanto, a maioria antecipou a celebração. Saíram várias matérias no ano passado registrando de forma adiantada o meio século do disco. E por uma razão muito simples: confiaram na data constante no rótulo, como se vê abaixo.
Em princípio, não há por que duvidar de uma informação que é impressa num disco à época de seu lançamento. Mas às vezes ocorriam atrasos, resultando numa defasagem entre a data indicada no selo e o momento em que o vinil chegava às lojas. Aconteceu com "Em Mar Aberto", do gaúcho Fernando Ribeiro, que só começou a ser vendido em 1977, embora tenha sido "carimbado" 1976. Pois é o mesmo caso de "Loki?". O lote não deve ter sido concluído a tempo para as vendas de Natal de 1974, então a gravadora achou melhor segurá-lo para bem depois das férias de verão e do Carnaval.
Aqui, um trecho do livro "Balada do Louco", de Mario Pacheco (não é meu parente), publicado em 1991.
Crítica de Tárik de Souza para a Veja. O texto não está completo, mas o importante, aqui, é verificar a data ao pé da página.
A resenha da revista Pop. Também consta a data para verificação (cliquem para ampliar). Observem que o lançamento foi praticamente simultâneo ao do primeiro disco solo de João Ricardo, dos Secos e Molhados. Essa casualidade não escapou aos críticos, na época: dois criadores de grupos lendários do rock brasileiro estreando como solistas ao mesmo tempo. Um detalhe que deveria ser lembrado até hoje, mas que se perdeu com a confusão causada pela data do rótulo do LP de Arnaldo.
Crítica de Okky de Souza na Tribuna da Imprensa de 1º de abril de 1975 (apesar da data, podem confiar nas informações). Por fim, sou informado pelo jornalista carioca Ricardo Schott de que o LP entrou na discoteca da Rádio Gazeta (referência usual para confirmação de datas de lançamento) em 26 de março de 1975. Logo, não há dúvidas. "Loki?" foi concebido em 1974, mas veio ao mundo mesmo no ano seguinte. Portanto agora é o momento certo para comemorar os seus 50 anos. 


Esta é uma versão revista e atualizada de uma postagem feita em 2015. Agradecimento a Alex Alberto e Márcio Aquino pelas imagens cedidas.

domingo, abril 06, 2025

Palavra nova

 Hoje aprendi uma palavra nova em inglês: "sentêncedi".