quinta-feira, março 27, 2014

Por que prefiro o CD

De vez em quando, em uma comunidade de colecionadores do Facebook, rola uma polêmica sobre o porquê de preferir o vinil ou CD. Pois eu confesso que, quando vejo esse fetiche todo pelo velho LP, eu me pergunto: será que só eu tinha problemas com o formato? Reconheço que o discão é vistoso, bonito, tem uma capa legal, alguns até uma embalagem dupla mais sofisticada, fartos encartes, etc. Admito que eu próprio gostaria de ter edições originais em vinil de alguns de meus álbuns preferidos dos anos 70, em especial aqueles que vieram em capas luxuosas. Mas para ter, não para ouvir. 

Estou com 53 anos. Compro discos desde os 11, praticamente. Até os 15 anos eu sofria com a agulha de um toca-disquinho Phillips, daquelas que destroem o sulco do disco. Até que, no Natal de 1975, fui agraciado com meu primeiro equipamento de som de verdade. Um Gavox relativamente simples, mas já era um avanço. E a partir daí eu passei a me preocupar com a preservação de meus vinis.

Em geral, eu cuidava bem dos discos. Tanto que tenho exemplares com mais de 30 anos que ainda devem estar praticamente em estado de novo. O problema é quando o "novo" já vinha velho. E os casos foram tão marcantes que acho que consigo lembrar de cada um deles individualmente.

O vinil brasileiro de "Olivia Newton John's Greatest Hits" que comprei em 1977 veio com "chiado de fabricação". Possivelmente, superfície irregular, cheia de microporos invisíveis a olho nu, mas que refletiam no som. Fui trocar o disco. Eles não tinham mais o mesmo título. Levei outro. Tive esse mesmo problema no LP "Glass House", de Billy Joel. Minha faixa preferida, "It's Still Rock and Roll to Me", tinha um chiado cíclico mais ou menos no ritmo da música. Mesmo no caso em que era possível fazer a troca, o lojista colocava o disco para rodar e não ouvia nenhum problema, no burburinho da loja. Ainda tentava colocar a culpa na minha agulha.

A agulha! Eu a trocava com mais frequência do que mandava lavar o carro! E o dia em que cheguei em casa e o braço do toca-discos estava sobre o prato? Deve ter sido a empregada, mas àquelas alturas seria inútil procurar culpados. O fato é que a agulha estava inutilizada. Um amigo meu também estragou uma agulha minha certa vez, sem querer. Mas não cobrei dele. Emprestar discos estava fora de cogitação: ninguém os cuidava como eu.

Trechos silenciosos no meio da música eram mais propensos a acumular poeira. Deviam ser sulcos mais largos. Lembro bem de dois casos: "An Occasional Dream" de David Bowie e "Feiticeira" dos Almôndegas. As duas gravações tinham um momento em que os instrumentos davam uma "pausa", ficando apenas algum som bem baixo. E aí se ouviam aqueles estalidos horrorosos que pareciam cortar todo o clima. Qualquer ruído estranho no meio de uma canção suave dos Carpenters, por exemplo, fazia o mesmo efeito.

Quando comprei o primeiro LP da Diana Pequeno, ele veio empenado. A agulha parecia dançar ao som da música. Tive outro disco também, não lembro qual, em que a prensagem estava desalinhada. Isso fatalmente resulta em oscilações mínimas de rotação. Como paliativo, eu procurei verificar para que lado era o desalinhamento, aí "cavoquei" para aumentar o orifício do disco e marquei a lápis o ponto que deveria encostar no pino.

Quanta incomodação, hein?

Um dos últimos vinis que comprei antes de aderir ao som digital foi uma coletânea do Supertramp. Esse veio com uma bolha visível a olho nu. Nem me preocupei em tentar trocar. Já enxergava o CD no meu horizonte. E, com ele, a solução para todos esses problemas que citei acima. Ainda lembro da paz que senti ao ouvir meus primeiros compact discs, agora sim, o som decalcado de qualquer corpo estranho que pudesse provocar interferência. Que maravilha, poder ouvir uma música bem suave do princípio ao fim e não ficar naquela insegurança de, a qualquer momento, ter minha experiência maculada por algum ruído indesejável.

Por isso eu digo: o vinil já foi tarde! Dane-se a capa, dane-se o discurso da pureza do som analógico. Que pureza, com discos desgastados pelo uso? Tenho muitos vinis pela raridade, pelo valor histórico ou simplesmente porque ainda não foram relançados em CD. De resto, não sinto a menor saudade dos LPs. E menos ainda me interessaria em comprar peças usadas, com possibilidade bem maior de já virem com defeito. Viva o CD!

Só mais uma observação. Mesmo sabendo que uma cópia em CD-R, WAV ou FLAC resulta idêntica ao original, CD pra mim é como selo pra filatelista: eu não coleciono xerox.

10 Comments:

Blogger Teo said...

Grande Emílio, li este post pensando que tinha sido eu a escrevê-lo. Concordo 100% contigo. Tal como tu faço 53 anos no corrente ano, comecei a ouvir música e comprar discos com 11 e várias vezes fiquei doido com os LPs e sua fritura ambulante. Cheguei ao ponto de lançar pela janela um LP das 4 estações do Vivaldi (daquela coleção de banca) porque não aguentei a chiadeira e fritura que arrasavam a beleza dos concertos que pretendia ouvir naquele disco. Fiquei com a capa que trazia um livreto interessante e educativo para meus parcos conhecimentos eruditos naquela época. O meu primeiro toca-discos era um Grundig Stereo, portátil, alemão da Alemanha. Muito bom para finais dos anos 60 - foi o meu pai que o comprou numa viagem àquele país. Mas logo que cresci um pouco e passei os 15 anos, avarbatei o Bang & Olufsen que o velho tinha comprado na Dinamarca e era o xodó dele... em pouco tempo derreti a agulha ao som de Made in Japan, Led Zeppelin 4, Black Sabbath e outros que tais... a música erudita e o jazz só chegariam no final dos anos 80. Mas quando comprei o meu primeiro leitor de CDs (um Gradiente, ainda morava em PoA nessa época) fiquei tão doido com a pureza de som que rebentei USD 500 em CDs na Kings, Pop Som e Discoteca no primeiro mês... a minha mulher quase me capou. Hoje tenho 3300 Cds (algumas cópias de discos que não consegui originais, ou de coisas menores) e só guardei o álbum duplo vermelho dos Beatles - pelo gozo, uma vez que não tenho onde reproduzi-lo - e 2 singles, sendo um deles PoP Corn, a primeira música eletronica feita por um computador segundo o meu pai, que me ofereceu o disco... Viva o CD!!!

11:59 AM  
Anonymous Italo said...

Ótima postagem, Emílio! Eu já sou da geração CD, porém, fico com medo do MP3 tomar cada vez mais conta. Detesto a idéia de não poder ter em mãos a mídia física. Seria materialismo meu? Acredito que não.

3:32 PM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Tecnicamente o mp3 não substitui o CD. Arquivos WAV (enorme) e FLAC, sim, podem conter a mesma quantidade de informação digital. Mas eu também gosto de ter o CD para pegar na mão, para guardar, para "ter". E as edições especiais estão cada vez mais caprichadas.

Teo, eu conheço "Pop Corn". Adoro!

3:37 PM  
Anonymous Italo said...

Esse materialismo, Emílio, acho que também se aplica aos jornais, revistas e livros em papel. Eu não consigo me acostumar com os leitores digitais, como tablets, Kindle, etc.

12:44 PM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Eu era resistente ao Kindle até ver a quantidade absurda de livros que tive para transportar na mudança. Daqui pra frente, o que eu puder, compro em Kindle. Até porque facilita a leitura. Em vez de carregar dois trambolhos de um lado para o outro, comprei a edição estendida da biografia dos Beatles pelo Mark Lewisohn em Kindle. Só não vou comprar em Kindle livros vistosos, visualmente ricos. Esses têm que ser em papel, mesmo.

7:22 PM  
Blogger El Thomazzo said...

Emilio, o que me 'comprou' com o CD foi a possibilidade de ouvir um disco inteiro sem precisar me levantar para virar o mesmo depois de 15 minutos. Se você está escrevendo e ouvindo música (algo que faço com frequência) faz toda a diferença poder se concentrar sem a necessidade de assim que você 'desanda' ter que sair do lugar e voltar ao ponto de partida... no caso de um álbum duplo queria dizer que ouvindo em CD você poderia economizar três levantadas em uma hora...

11:28 PM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Essa é mais uma vantagem. Ainda que nem todos os álbuns-duplos caibam num CD só. Mas muitos cabem.

5:34 AM  
Blogger El Thomazzo said...

Os álbuns duplos que não cabem em um CD são longos o suficiente para compensarem a levantada a mais... você podia falar também naquelas questões de masterização, de que a última(s) música(s) de cada lado do LP tinha que ser mais lenta para não embolar o som, algo que não existe no CD... que em resumo, quem quer ouvir música prefere o CD, já quem quer se exibir...

11:27 AM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Entendo o que você quer dizer, El Thomazzo, mas esse argumento de que o que importa é ouvir a música não pode ser levado ás últimas consequências, porque aí estaremos apoiando os que preferem baixar arquivos executáveis. Eu realmente me apaixonei pelo CD como um todo. Principalmente pela qualidade de som, claro, mas acho bonito o disquinho de cinco polegadas, o rótulo de um CD novinho, uma embalagem bem feita, etc. Eu lembro que, quando o CD estava chegando, comentei com um amigo meu que ficaria complicado reproduzir aqueles encartes fartos em informações dos LPs. Pois eles acharam a solução perfeita com os livretos. Certa vez escrevi um texto para o International Magazine intitulado "CDs pra ler". Alguns CDs trazem verdadeiros livros junto, em especial as melhores boxed sets.

7:04 AM  
Blogger El Thomazzo said...

Nesse contexto a comparação é entre discos de vinil e CDs (nem vamos falar em fitas cassete, né?)...

1:15 PM  

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