quinta-feira, março 17, 2005

Autor falso, pensamento verdadeiro

Um dia fui buscar meu filho na casa de minha ex-esposa. A separação era recente e ainda havia um clima de mágoa no ar. Na cozinha ela havia colocado um mural onde aparecia um cartão com os seguintes dizeres:

Amo a liberdade, por isso todas as coisas que amo deixo-as livres. Se voltarem é porque as conquistei, se não voltarem é porque jamais as possuí.

Eu não tive dúvidas do porquê de ela ter se identificado com a citação. Aquilo era para mim. Jamais esqueci o texto nem o autor a ele atribuído: Charles Chaplin. Mas hoje, depois de constatar tantas falsas autorias circulando pela Internet, me pergunto: esse pensamento é mesmo do Chaplin?

Se deveras tivesse sido o genial ator do cinema mudo quem criou esses dizeres, não deveria ser difícil localizar o original em inglês. Uma rápida busca no Google encontrou o seguinte:

If you love someone, let them go. If they return to you, it was meant to be. If they don't, their love was never yours to begin with.


De cara, percebe-se que o pensamento em português não é uma tradução, mas uma adaptação. Por outro lado, uma tradução muito literal poderia tirar o impacto do texto. Por exemplo: “Se você ama alguém, deixe-os ir. Se retornarem para você, é porque era para acontecer. Se não, o amor deles nunca foi seu, pra começar.” Mesmo assim, duas coisas me chamaram a atenção em minha pesquisa. Primeiro: em lugar nenhum está escrito “amo a liberdade”. Segundo: em todos os sites onde encontrei a citação, constava “autor desconhecido”. Por tudo isso, e pelas experiências que já tive, prefiro decretar que esse texto não é de Chaplin até prova em contrário.

Mas, como dizem aqueles internautas mais insistentes quando descobrem uma autoria falsa, “pode não ser do Chaplin, mas é bonito”. E verdadeiro. É inútil tentar “reivindicar” uma importância maior na vida de alguém. Tem que deixar rolar. Às vezes o coração grita “fica, fica”, mas por fora, temos que deixar que as pessoas tomem suas próprias decisões. E se não for a que gostaríamos, temos que aceitar que “não era para ser”.