Calabocando
Seja como for, eu devia ter menos de 5 anos quando nossa família alugou um apartamento em Tramandaí, para veranear. Era um daqueles prédios de praia iguais a tantos outros, com corredores abertos protegidos por amuradas e uma escada no ponto central. Um dia um cachorro estava latindo sem parar e eu, com autoridade, mandava que se calasse. Minha mãe quis saber o que estava acontecendo e eu respondi:
- Eu tô calabocando o cachorro!
E ali eu, sem qualquer conhecimento de gramática, criei o verbo "calabocar", primeira conjugação, que fez sua estréia no gerúndio. O presente do indicativo seria: eu calaboco, tu calabocas, ele calaboca, nós calabocamos, vós calabocais, eles calabocam. Talvez eu achasse que, quando alguém gritava "cala a boca!", estava conjugando o verbo "calabocar" no imperativo. Eu também pensava que "destamanho" fosse uma palavra só, sinônimo de "grande". "Peguei um peixe destamanho". Só que, nessa hipótese, o verbo calabocar seria intransitivo e minha frase estaria incorreta de qualquer forma. Eu não poderia "calabocar" o cachorro, o cachorro é que teria que "calabocar" em obediência a minha ordem.
Pois foi com imensa satisfação que vi, nesse último fim-de-semana, o Rei Juan Carlos, da Espanha, calabocando o Presidente Hugo Chavez, da Venezuela. Eu sempre tive dúvidas sobre a real (sem trocadilho) função de um Rei, achando que era apenas uma figura decorativa para manter uma tradição. Agora vejo que não, que o Rei também serve para calabocar os Chefes de Estado que falam demais. Independente de qualquer posicionamento político, sempre achei Chavez um chato. Tem mais é que ser calabocado, mesmo.
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