Mistérios da política
Na minha infância e adolescência eu me considerava de direita. Era simpatizante da Arena. Não tinha a mínima idéia de que vivíamos numa ditadura. Achava perfeitamente normal que a eleição para Presidente fosse indireta, imagina, um cargo tão importante não pode ser escolhido pelo povo! A censura eu também considerava algo necessário e volta e meia me pegava questionando: "como a censura deixou passar isso?" Ou então repetia uma frase costumeira da minha mãe: "Isso devia ser proibido!" Minha cabeça era condicionada a aceitar a situação como a ideal. Quem votava na oposição era por modismo e rebeldia, eu pensava.
Não lembro exatamente quando começou a minha mudança de posicionamento. Quando entrei para a Faculdade, em 1979, ainda me considerava de direita. Acho que foi em 1981, quando comecei a trabalhar. Só sei que, em minha primeira eleição, em 1982, votei em Pedro Simon para Governador. Muitos ficaram surpresos quando eu contei, pois tinham certeza que minha escolha recairia sobre Jair Soares, que foi quem acabou vencendo. Mesmo alguns amigos que não simpatizavam com o PDS admiravam a figura de Jair e imaginavam que eu teria todos os motivos para votar nele.
Depois disso, tive uma fase PMDB, uma fase Brizola e finalmente a fase PT, que ainda perdura. Eu teria votado em Olívio Dutra em 1982 se a eleição fosse em dois turnos, mas com um só turno achei melhor fazer o famoso "voto útil". Mas ali eu ainda não "estava" PT, minha admiração era pelo Olívio, mesmo. A minha atual predileção pelo partido de Lula, mas sem exageros, me rende antipatias dos dois lados. Quem é anti-PT me critica por ser simpatizante. Já quem é petista roxo vê minha moderação com desconfiança, acha que sou na verdade um anti-PT enrustido que quer ficar bem com a turma. Ora, é claro que não! Apenas não me alinho a algumas atitudes de radicalismo que presencio, às vezes. Por exemplo: quando Rigotto e Lula foram eleitos, o jornal O Sul utilizou um recurso muito usado por revistas, que foi o de imprimir "duas capas". A capa mostrava Rigotto. A contracapa trazia Lula, mas impressa invertidamente, de forma que pudesse ser usada como capa alternativa. Ora, não houve santo que convencesse os petistas roxos que o jornal não havia feito uma afronta a Lula imprimindo a sua foto "de cabeça para baixo". Tentei explicar o recurso das duas capas, mas ninguém quis entender, estavam todos cegos e surdos pelo fanatismo.
O capitalismo até funcionaria se as pessoas fossem boas, mas aí até a anarquia daria certo. Existe uma idéia – se é falsa ou verdadeira, realmente não sei – de que os simpatizantes da esquerda não poderiam viver uma vida de conforto e consumo, pois é contrária a seus princípios. Só sei que vi gente aos montes do Fórum passeando no Shopping Praia de Belas. Às vezes evito me questionar muito sobre os meus votos e simpatias (nenhuma conotação mística), pois tenho receio de entrar em contradição. Gosto de consumir, gosto de viver bem, não gosto de não conseguir pagar minhas dívidas e repudio as injustiças sociais. Sempre que ouço falar em "mecanismos de inclusão social", imagino uma máquina cheia de engrenagens à mostra com uma placa indicativa: "para ser incluído, entre aqui". Talvez o dia em que inventarem mesmo esse aparelho eu consiga comprar meus DVDs e votar no PT sem a sensação de que estou sendo patrulhado.
2 Comments:
Texto muito bom, como de praxe. E agora, Emílio? Como está politicamente em 2015? Ainda PT?
Ainda, por falta de uma alternativa melhor. Votei na Dilma, mas não sei se teria votado no Lula, fosse ele o candidato. Por outro lado, jamais teria votado em Aécio. O PT pode até me perder, mas o "antipetismo" não vai me ganhar. Sugiro a leitura de dois outros textos meus aqui do blog. Seguem os links:
http://emiliopacheco.blogspot.com.br/2005/08/paixo-resistente.html
http://emiliopacheco.blogspot.com.br/2006/03/o-antiantipetismo.html
Postar um comentário
<< Home