Mutantesmania em Porto Alegre
A platéia foi chegando aos poucos, sem muito alarde, ocupando integralmente os assentos do Teatro do Sesi. Mas quando as luzes se apagaram e a mensagem pré-gravada de apresentação pronunciou "Mutantes", foi como se uma palavra mágica os libertasse de um feitiço que os mantinha em silêncio. A vibração tomou conta do ambiente. Logo se ouviu a introdução de "Dom Quixote", enquanto a banda tomava seu lugar. A proibição de que se usassem máquinas fotográficas foi ineficaz: o que mais se via eram braços erguendo caixinhas prateadas onde o brilho do visor LCD miniaturizava as luzes do palco. Mesmo os fotógrafos credenciados haviam sido instruídos a fotografar somente as três primeiras músicas e não se posicionarem diante do palco, mas também não adiantou: logo o espaço em frente às cadeiras foi invadido. Com certeza uma quantidade significativa de fotos e vídeos foi captada naquela noite, dos mais diversos ângulos. Registre-se que alguns dos que pagaram 120 reais por uma cadeira de platéia baixa reclamaram dos que ficaram de pé à sua frente.
Zélia Duncan pode não ser Rita Lee, mas é perfeita para os Mutantes do novo milênio. Tem carisma, ótima presença de palco e sua voz grave e límpida se adapta com perfeição às músicas. O guitar hero Sérgio era o mais entusiasmado, sorrindo com notável felicidade pelo carinho dos gaúchos. Sua voz continua a mesma, como se pôde constatar em "Virgínia" e "2001", entre outras. Mas as atenções maiores são para Arnaldo, que literalmente nasceu de novo após um acidente em 1981. Depois de um longo período de reclusão a la Syd Barrett, ele está de volta. Tranqüilo nos teclados, ele tinha diante de si um monitor onde apareciam as letras das músicas com as cifras e as partes que ele teria que cantar destacadas em amarelo. Seu nome era o mais chamado pela platéia e ele retribuía às reverências com jeito de menino. O baterista Dinho mantinha o pique com a mesma vitalidade dos velhos tempos. Quanto aos músicos e vocalistas adicionais, é um recurso que lembra o Pink Floyd quando voltou sem Roger Waters. O objetivo é reconstituir da melhor forma possível a sonoridade original. Se para isso for preciso reforçar o grupo, que seja. O importante é dar um bom show e isso os novos Mutantes fazem bem demais.
A letra de "Caminhante Noturno" com cifras e trechos destacados no monitor de Arnaldo (clique para ampliar)
O repertório foi o mesmo do DVD gravado em Londres, exceto que as músicas que haviam sido apresentadas em inglês no show britânico aqui ganharam uma versão bilíngüe (menos, obviamente, "Tecnicolor", que foi composta originalmente em inglês). Por exemplo, "Panis et Circensis" foi toda cantada em português, até que no final, depois de repetirem algumas vezes "as pessoas na sala de jantar", mudaram para "the music lighted with the heat of the sun". O público cantou junto em todas as composições e, no espaço frontal invadido, todos pulavam a ponto de deslocar a emenda do piso com o palco ao ritmo da música. Logo, não é exagero dizer que os Mutantes literalmente sacudiram o teatro. As luzes deram um show à parte que pôde ser mais bem apreciado por quem estava para trás, com uma visão global do jogo de fachos. Enfim, foi uma noite gloriosa para todos. Os mais velhos reencontraram uma parte de seu passado que pensavam que nunca voltaria e os jovens poderão dizer a seus netos que assistiram a um show dos Mutantes.
Compareci ao show representando o International Magazine, jornal mensal de música publicado no Rio de Janeiro. O IM ainda não tem página na Internet, mas alguns textos são publicados no site Let's Rock. Conheça também o Portal da Jovem Guarda, organizado pelo editor do IM, Marcelo Fróes. Para assinar o IM, que publica 11 números por ano, envie um e-mail para magainter@yahoo.com.br .
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