sábado, novembro 12, 2005

Um Verissimo legítimo

Quebrando a regra de que textos encontrados em blogs com assinatura de Luis Fernando Verissimo não são realmente dele, gostaria de dividir com vocês esta pérola que tenho em meus guardados. Este texto foi publicado no número zero da revista Red 32 de abril de 2000, sem título. Não sei se saiu em algum livro depois.

Quando me perguntam, fora daqui, se é verdade que há uma Gisele Bündchen em cada horta na zona de colonização alemã do Rio Grande do Sul, respondo que não, que há várias. Digo que a família põe todas a trabalhar desde cedo, e as que não dão para a roça é que vão ser modelos. E não adianta discutir.

a) Mas pai, eu quero trabalhar na roça.

b) Não pode, guria, Tu não dá pra coisa. Vamo ter que te mandar pra agência Ford.

E lá vai ela ser modelo e desfilar pelo mundo, pensando o tempo todo nas suas irmãs plantando e colhendo e depenando galinha e namorando o Altemiro e se divertindo na roça, e suspirando.

Também digo que na zona de colonização italiana é a mesma coisa, e que quando dizem para um pai da região que uma filha dele é a cara da Sophia Loren moça e vão levá-la para a televisão, ele pensa: "Ainda bem que não viram as bonita". E também digo que se as nossas alemoas e gringas impressionam tanto, é porque não viram o que deu a cruza de português com castelhano, negro e índio, e que forma uma espécie de reserva de mulher, a ser melhor explorada quando descobrirem o seu valor, um pouco como o nosso carvão.

E quando chegam aqui e me perguntam o que a gente faz com as gaúchas feias, eu confirmo a suspeita. Sim, é verdade, elas ficam trancadas para não aparecer para forasteiros e estragar a nossa reputação nacional. Mas não é uma coisa tão desumana quanto parece. O lugar onde elas ficam é confortável, elas são bem tratadas, e o beliche dá para as duas.


Luis Fernando Verissimo