terça-feira, outubro 18, 2005

Opiniões influentes

Ainda sobre a quase impossibilidade de mudar a opinião de alguém no grito, lembrei-me de uma situação bastante comum no dia-a-dia, tanto na família quanto no trabalho. Continuo achando que, quando uma decisão está tomada, é ingenuidade acreditar que se pode mudá-la com argumentos. Mas existem casos de incerteza em que os conselhos podem dar resultado. E aí é que se observa um fenômeno interessante: algumas pessoas são mais ouvidas do que outras. Não significa que seus argumentos sejam mais coerentes ou esclarecedores. São apenas indivíduos influentes, carismáticos, que gozam de mais credibilidade. Podem usar as mesmas palavras de outros que não foram convincentes, mas conseguem fazer com que surtam efeito.

Isso às vezes é frustrante para quem não foi feliz em sua argumentação. Você está no trabalho, tentando expor suas idéias, mostrar o caminho que julga ser correto, e seus colegas não se convencem. Aí vem outro, diz a mesma coisa e todos param, raciocinam, refletem, ponderam e concluem que, "pensando bem", a idéia não é má. Por quê? Porque o outro sujeito é tido como um profissional competente, experiente, de visão. Se ele disse, no mínimo, merece ser analisado. Quando você falou, seus argumentos pareceram frágeis. Mas se o "bam-bam-bam" da empresa pensa o mesmo, acaba passando a impressão de que algo lhes escapou. Se ele pensa assim, deve estar certo. E como quem procura acha, os colegas acabam encontrando motivos para apoiar a idéia. Mas só depois que ela foi defendida por alguém de influência. Mas pode ser pior: muitas vezes ninguém lembra que você também havia feito a mesma sugestão.

É irritante, é injusto, mas é normal: quando alguém que desfruta de nosso respeito e confiança emite uma opinião contrária, no mínimo, isso nos faz refletir. Se um fanático religioso diz que é a favor do desarmamento, eu descarto a opinião como "típica". Mas no momento em que não só Luis Fernando Verissimo mas também Moacyr Scliar se posiciona no lado do "sim", minha tendência é pensar: será que algo me escapou? Dois gênios da literatura pensando diferente de mim? Esse fato é suficiente para me motivar a, pelo menos, ler os argumentos deles.

Em sua crônica "Por que sim", publicada ontem em Zero Hora, Verissmo expõe que prefere o desarmamento, "que dá mais recursos à autoridade para pegar o criminoso antes do crime, à banditização de todo o mundo." Já Scliar, em sua coluna de hoje, vale-se de sua experiência de médico para justificar seu voto. E acrescenta: "Um trabalho publicado no importante New England Journal of Medicine particularmente me impressionou: mostrava que, das armas guardadas em casa para eventual defesa contra assaltos, a imensa maioria era usada contra familiares." Nesta hora os crentes podem questionar: por que o "sim" de Verissimo e Scliar merece mais atenção do que o dos devotos? Por que me interesso pelos argumentos de dois escritores e não dos que agem movidos por sua fé? Entendo esse sentimento. E garanto a todos que também tenho fé.

As colunas citadas me fizeram pensar, sim. Eu estava disposto a rever minha posição se os argumentos me convencessem. Mas não convenceram. Continuo dizendo que os bandidos não serão desarmados. Ademais, eu, Scliar e Verissimo moramos em Porto Alegre, uma cidade em que a violência é ainda pequena se comparada ao Rio de Janeiro, São Paulo e outras capitais. Não vai muito longe: aqui mesmo, no interior do Rio Grande do Sul, os motoristas de táxi de Caxias do Sul equiparam seus veículos com cabines à prova de balas. É preciso, sim, combater o problema da criminalidade. Mas enquanto não vivermos num mundo ideal, acho temerário desarmar a população.