quarta-feira, outubro 27, 2004

Livros não lidos

Às vezes eu me pergunto se sou a única pessoa que compra mais livros do que consegue ler. Olho ao meu redor e me assusto com a quantidade de livros comprados e ainda não lidos. Porque eu quero ler todos. E a possibilidade de que não venha a conseguir me deixa preocupado. Começo a ter fantasias malucas que é bom nem verbalizar, mas que redundariam em eu ter que ficar um longo tempo de cama, em recuperação, sem poder fazer mais nada a não ser... ler! Aí eu inauguraria em grande estilo os meus "óculos para perto" e devoraria uns dez livros por semana. Duvidam?

A verdade é que a Internet me abriu possibilidades de consumo inimagináveis em outros tempos. Sites como a Amazon e a Abebooks me permitem encomendar livros dentro e fora de catálogo em questão de segundos. Edições raras que antigamente eu sonhava em varrer os sebos de Nova York para encontrar, acabei comprando sem sair de casa. E não adianta, que não paro de comprar. Posso dar uma pausa, mas logo volto à carga.

Engraçado que, até os 20 anos, eu lia muito pouco. Devorava, sim, os meus adorados gibis. E a Ebal tinha um estilo formal de redação que, consumido em grande quantidade, acabava compensando a falta de leitura de livros propriamente ditos. "O Homem da Máscara está aqui dentro! Matar-nos-á!" E assim, pela simples assimilação das histórias em quadrinhos, eu fui aprendendo a usar mesóclises, crases e palavras mais complicadas como "entrementes" e "doravante". Depois a Bloch e a Abril, sucessivamente, passaram a publicar os personagens que eu lia e resolveram adaptar a linguagem para um estilo mais jovem, com farto uso de gíria.


Foi minha paixão por música que me levou a gostar de livros. Quando (re)descobri os Beatles, aos 12 anos, meu sonho de consumo era a obra "A Vida dos Beatles", de Hunter Davies, que infelizmente estava fora de catálogo. Só muitos anos depois, já tendo aprendido inglês, fui encontrar uma edição de bolso americana na Livraria do Globo. Depois achei uma biografia de Stevie Wonder e comprei também. Assim, aos poucos, fui aprendendo a gostar de ler não-ficção. Se é coincidência ou não, não sei, mas era só o que o meu pai lia, também. A maioria de meus livros é sobre música, mas tenho também muita literatura sobre jornalismo, cinema, televisão e História do Brasil recente.

Se eu ganhasse na Mega Sena e não precisasse mais trabalhar, tiraria alguns meses para uma maratona de leitura. Mas vai ser difícil, porque eu não jogo. Minhas chances de ganhar são, digamos, um pouco menores do que as de quem joga. Então o jeito é reorganizar meu tempo, mesmo. Meu tempo, não: minha vida. Se pudesse falar com alguns de meus livros, diria a eles que posso não tê-los lido ainda, mas não os esqueci e penso neles todos os dias.