quarta-feira, agosto 25, 2021

Charlie Watts e a questão de ser (ou não) insubstituível


Charlie Watts, baterista dos Rolling Stones, faleceu ontem, aos 80 anos. Não é o primeiro Stone a partir. A morte do guitarrista Brian Jones aos 27 anos, em 1969, ficou marcada na biografia do grupo, em especial pelas circunstâncias: ele foi encontrado afogado em sua piscina. E foi substituído por Mick Taylor. O qual, por sua vez, deu lugar a Ronnie Wood em 1975. 

Eis a questão: como ficam agora os Rolling Stones sem seu baterista? Apesar da idade avançada de todos, a banda pretendia retomar os shows após a pandemia. E, se Brian Jones e Mick Taylor tiveram substitutos, por que não arregimentar um novo integrante para assumir as baquetas? Os fãs mais leais protestam: não pode haver Rolling Stones sem Charlie Watts! E lembram o caso do Led Zeppelin, que acabou após a morte de John Bonham. Por outro lado, The Who continuou sem Keith Moon, depois sem John Enwistle. Queiramos ou não, sempre há membros mais ou menos insubstituíveis em um grupo. Se tivessem sido Roger Daltrey ou Pete Townshend a falecer, o Who não continuaria. 

Vejam bem a foto acima. O que está errado aí? Cadê o Ringo? Está no hospital, tirando as amígdalas. No lugar dele, entrou Jimmie Nicol, tocando com os Beatles em junho de 1964 na Dinamarca, Holanda, Hong Kong e Austrália. Se fossem John e Paul os enfermos, as apresentações teriam saído mesmo assim? Esse é o problema dos bateristas: por mais originais que eles sejam, por mais que deixem uma marca inconfundível em sua maneira de tocar, eles sempre são vistos como substituíveis. O mesmo vale para qualquer integrante que apenas toque um instrumento, embora a bateria, por se restringir ao ritmo, carregue esse estigma de uma suposta impessoalidade. Nem mesmo os Beatles em seu auge escaparam de ter que recorrer a um substituto (e nem entro na questão dos bateristas anteriores a Ringo, que esses perderam o melhor da história).

Existem casos em que a troca de membros em um grupo vai além do que os fãs considerariam razoável, gerando protestos ou, no mínimo, exigindo uma tolerância acima da esperada. Eu sou fã do Kiss praticamente desde o primeiro disco e fui tomado de surpresa pela saída do baterista Peter Criss em 1980. Eles eram quatro rostos facilmente identificáveis. Além disso, Gene, Paul, Ace e Peter eram como John, Paul, George e Ringo, nomes que a gente se acostumava a ler e ouvir em sequência. Até que a regra foi quebrada. MPB-4 também era um quarteto imutável até a saída de Ruy e o falecimento de Magro. Genesis se tornou outra banda sem Peter Gabriel, mas sobreviveu bem. Supertramp sem Roger Hodgson é mais difícil de aceitar. O Yes atual não tem nenhum integrante fundador. Roger Waters tentou argumentar que não poderia existir Pink Floyd sem ele em 1987, mas não teve o menor pudor de assumir as rédeas do grupo em 1968, com a defecção do líder e fundador Syd Barrett. Os Secos e Molhados voltaram em 1978 e desde então persistem com as mais diversas formações, inclusive João Ricardo sozinho. E Renato e Seus Blue Caps estão seguindo em frente... sem Renato!

Portanto, caros fãs dos Stones, não se estressem. Quem vai decidir se Charlie Watts é insubstituível ou não são os membros sobreviventes. Afinal, it's only rock and roll.