Maitê Proença
Em primeiro lugar, sejamos realistas. Se tivesse sido uma atriz portuguesa a debochar do Brasil, a nossa reação teria sido do tipo IPP: "Igual Pra Pior". Nós, brasileiros, temos uma tendência de encarar qualquer manifestação mais irônica ou contundente de pessoa estrangeira como uma tentativa de inferiorização. Imagine então como nos comportaríamos diante de chacota explícita. Também não é verdade que saibamos rir de nós mesmos. O que fazemos, isto sim, é debochar uns dos outros entre as diferentes regiões, já que o país é bem grande. E as brincadeiras não são bem aceitas. Há alguns anos, circulava entre os gaúchos um e-mail caretíssimo conclamando a boicotar o programa Casseta e Planeta por estar "denegrindo a imagem do Rio Grande do Sul". Não vai muito longe: eu só imagino como o povo da Bahia reagiu ao exemplo citado por Maitê do "baiano, que é indolente".*
Todos nós, em algum momento, falamos mal de alguém ou fazemos observações politicamente incorretas na intimidade. Como eu escrevi em meu texto "Fofoca, não", é uma forma benigna de cada um extravasar o veneno que tem dentro de si. Mas se o que foi dito chega aos ouvidos de quem foi alvo da crítica, o estrago está feito. É por isso que eu prefiro nunca saber se alguém falou mal de mim. Não leva a nada de positivo e diminui as chances de a pessoa em questão vir a ser uma amizade sincera.
A verdade é que Maitê foi ingênua e inconsequente. Não percebeu que, na era internética e parabólica em que vivemos, as informações atravessam o mundo em questão de segundos. É claro que o fato de não prever que o vídeo chegaria além-mar não exime a atriz da impertinência de seus comentários. Mas acho que há, sim, uma sutil diferença entre a afronta proposital e aquela que, digamos, vaza. O caso mais evidente foi o do Ministro da Fazenda Rubens Ricupero, em 1994. Aguardando o momento de entrar no ar, Ricupero ficou conversando informalmente com o jornalista Carlos Monforte, da TV Globo, sem saber que sua fala estava sendo captada por telespectadores com antena parabólica. Com a repercussão de suas confidências, só lhe restou renunciar.
Alguns dirão que a comparação não procede. De fato, Ricupero falava em off para um único interlocutor, sem saber que o microfone estava em on. Já Maitê dirigia-se de forma consciente a um público. Apenas supunha, em sua irresponsabilidade, que estaria restrito ao Brasil. O que existe de comum nos dois casos é a presunção de que a mensagem não chegaria a um receptor indesejado. No caso de Ricupero, por uma questão de confiança. No de Maitê, por total imprudência. Quando os portugueses tomaram conhecimento da forma com que a atriz divulgou Portugal em um programa da TV brasileira, criou-se o incidente.
Eu gostaria de poder dizer aos amigos de Portugal que não levassem esse episódio tão em pé de guerra. Que lembrassem que vocês também contam "anedotas de brasileiros" e que a própria Maitê se expôs ao ridículo com a ignorância que demonstrou sobre o país. Mas, a julgar pelas reações que vejo na Internet, vai ser difícil. No YouTube, uma cidadã portuguesa aparece quase chorando, num magoado desabafo. Maitê era ídolo em Portugal e não só as novelas como também as músicas que vêm do Brasil sempre tiveram boa acolhida pelos portugueses. É muito fácil acirrar ânimos, tanto lá quanto aqui. Menos mal que alguns estão sabendo diferenciar a atriz do povo brasileiro, a quem dizem respeitar. Torçamos para que esse deslize tenha um final pacífico.
Este vídeo mostra o espírito esportivo de Maitê Proença ao participar de uma sátira a novelas brasileiras com o grupo humorístico português Gatos Fedorentos. Observem que a imitação que eles fazem do sotaque brasileiro é tão perfeita que eu próprio fiquei em dúvida se eles eram mesmo portugueses. Maitê, em contrapartida, tenta falar com o sotaque deles. É assim que brasileiros e portugueses deveriam se relacionar, com camaradagem e bom-humor.
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