sexta-feira, setembro 28, 2007

Mistérios da ficção

Hoje o Brasil parou para assistir ao último capítulo de "Paraíso Tropical". Especificamente, todos queriam saber quem matou Taís. Existe um aspecto a respeito de mistérios como esse que, de certa forma, me decepciona. É algo que eu já questionava em minha adolescência, mas em relação aos gibis. Desde que a Marvel rompeu com o formato tradicional dos enredos fechados, as histórias em quadrinhos se transformaram em longas e intermináveis novelas. Cada herói tem sua cronologia, com princípio e meio, mas sem fim.

E assim, em minha infância, eu acompanhei as aventuras do Homem-Aranha contra um inimigo mascarado cuja identidade era desconhecida: o Duende Verde. Quem seria ele? J.J. Jameson? Frederick Foswell? Depois de vários meses, seu nome foi finalmente revelado, numa história antológica. Mas, para mim, uma dúvida persistia. Será que o autor, Stan Lee, já havia planejado desde o começo a verdadeira identidade do vilão? Ou foi uma decisão de última hora? Tive a resposta em minhas leituras de fanzines e livros sobre quadrinhos. Não só a identidade do Duende foi decidida em cima do laço, como motivou uma discussão com o desenhista Steve Dikto. O artista queria que o Duende fosse alguém totalmente desconhecido. Stan Lee achava que isso seria uma traição ao leitor. O resultado é que Dikto, que criou o visual do Aranha, foi substituído por John Romita.

Existe realmente suspense num mistério que nem o próprio autor sabe como vai se desvendar? A telenovela brasileira já teve antológicos "quem matou": o Velho Max, Michel Fragonar, Salomão Hayala, Odete Roitman... Houve até um caso em que o assassinato ocorreu na última semana e a novela terminou sem que o autor fosse revelado. Como havia muitas apostas em jogo, Janete Clair apareceu no Fantástico para dar o nome do matador e do mandante. Além disso, as atores estavam sendo incessantemente questionados pelo público, que por certo imaginava que o braço que segurou a arma na cena do crime pertencia ao ator que vivia o papel do assassino. Agora fico desconfiado se todos esses não foram também decisões adiadas até o último instante. Os telespectadores ficavam imaginando "quem teria sido", mas isso iria depender da inspiração do autor na reta final.

Lembro que, no primeiro capítulo da novela "O Salvador da Pátria", a Professora Clotilde (Maitê Proença) insinuava a Paulo (Marcos Paulo) que havia em seu passado um fato horrível que ela preferia esquecer. E assim esse mistério se arrastou por bons três quartos da trama, até que finalmente se soube que Clotilde havia provocado a morte do filho ao errar a dose de um medicamento num momento de embriaguez. Ah, então o "segredo terrível" era apenas isso? Sim, foi o melhor que o autor conseguiu pensar depois de tanto tempo. Não vai muito longe: eu próprio, se quisesse, poderia anunciar "uma grande surpresa, breve, aqui no blog". E só depois inventar alguma coisa.

Eu quero acreditar que, pelo menos nos livros, o final é cuidadosamente planejado com antecedência. Ou talvez não. Como saber? É tudo faz-de-conta, o autor pode incriminar quem ele bem entender, dar as mais absurdas guinadas, criar os motivos mais implausíveis para que o assassino seja quem você menos espera. Ou mesmo alguém que ele próprio não planejava escolher. Mas, para os telespectadores, fica aquela ilusão de que "o tempo todo" o criminoso esteve diante de seus olhos e eles nem desconfiavam.

Depois de tudo isso, devo admitir que o final de "Paraíso Tropical" foi coerente e bem bolado. Acho que não foi resolvido de última hora. Parabéns aos autores.