segunda-feira, junho 05, 2006

Histórias em quadrinhos

Quem hoje me conhece como um assumido "fanático por música" (aliás, o único tipo de fanatismo que eu admito que me atribuam) não imagina que, em certa época de minha vida, minha grande paixão foram as histórias em quadrinhos. Aprendi a ler cedo e logo estava folheando revistas como Tio Patinhas, Pato Donald, Bolinha e Luluzinha. (É bom frisar que eu não usava o termo "gibi". Até uma certa idade, nem o conhecia. Eu comprava, lia e colecionava revistas.) Mais adiante, motivado pela série de TV, comecei a ler Batman. E depois Super-Homem.
Em 1967, estreou na TV Gaúcha a série de desenhos precariamente animados "Super Heróis Shell" no espaço do programa Dozelândia, apresentado pelo Vovô Joaquim. Foi o começo da Marvel Comics no Brasil. Os heróis eram Capitão América, Homem de Ferro, Hulk, Namor e Thor. O lançamento foi concomitante com a publicação revistas de número zero que eram vendidas exclusivamente em postos Shell. Depois, passaram a sair regularmente nas bancas.
Quem me visse talvez lamentasse que aquele menino gordinho deveria sair mais e praticar esportes. Pois eu não me arrependo de ter vivido intensamente aquele mundo de fantasia. Gastava o dinheiro de minha mesada no Stand Vera Cruz da Praça da Alfândega, em Porto Alegre ou, em Capão da Canoa, na Praiana. Ou mesmo nas bancas de Atlântida. Na casa da praia, entrava na minha "cabana de índio" levando as revistas junto e mergulhava nos quadrinhos, acompanhando cada história com interesse. As revistas que eu comprava na praia, deixava lá, para reler nos veraneios seguintes. E assim aguardei com entusiasmo o lançamento do primeiro número totalmente a cores publicado pela Ebal, que foi o Super-Homem. Lembro da participação especial que o Homem-Aranha fez na revista do Thor para tempos depois ter seu próprio título lançado. Adorei o Demolidor. Virei fã do Judoka, que era um herói brasileiro. Surpreendi-me com a verdadeira identidade do Duende Verde.

Eu nunca deixei de gostar totalmente de quadrinhos, mas o meu auge como leitor assíduo foi entre 1967 e 1970. Depois disso, meus interesses começaram a se diversificar. Mas recordo de um fato que, para mim, ficou como última lembrança marcante dessa minha fase. O Almanaque do Homem-Aranha de 1971 trazia uma história completa de como o aracnídeo precisou enfrentar o Dr. Octopus para conseguir um soro para salvar sua Tia May. O suspense da trama me prendeu de tal forma que eu levei a revista para a mesa na hora da refeição, para não interromper a leitura! Eu nunca tinha feito isso.

Hoje não consigo me entusiasmar com heróis novos. Aproveito o meu inglês para reler as histórias do meu tempo, que são compiladas em séries em formato de livro como Essential, Masterworks (da Marvel) e Showcase (da DC), entre outras. Especialmente as tramas escritas por Stan Lee são caracterizadas por vários quadrinhos de luta entre o herói e um de seus inimigos. Na infância as "brigas" dos personagens me empolgavam. Eu me angustiava quando o herói era golpeado e vibrava quando ele reagia. Hoje eu vejo que o confronto é apenas uma forma de gastar páginas e mais páginas sem muita evolução sob pretexto de "ação". Geralmente passo batido nesses quadrinhos e vou direto ao que interessa: quem ganhou? A partir daí é que a história volta a se desenrolar.
Muitas das histórias do meu tempo estão sendo republicadas em português por editoras como a Mythos. Mas aí eu sou como os fãs de séries de TV: eles valorizam a dublagem original e eu a tradução da EBAL, com seu português castiço cheio de mesóclises, "doravantes" e "entrementes". Ótima também era a seção "Notícias em Quadrinhos", em que eram respondidas cartas dos leitores e anunciadas novidades da editora. A EBAL deixa saudades, sem dúvida. Assim como as antigas edições da Rio Gráfica (que comprou a Editora Globo, assumindo seu nome) e de O Cruzeiro. Hoje freqüento duas comunidades do Orkut que me levam de volta àqueles tempos: "Desenhos Desanimados Marvel" e "EBAL – Editora Brasil América". Aí lembro da emoção que era entrar em uma loja de revistas forradas de publicações da EBAL e tantas outras e sentir aquele cheiro que os gibis de hoje não exalam mais. Um dia disse para o meu pai: "Quando eu entro numa banca de revistas o meu coração se abre". Ele gostou tanto da frase que a repetiu para minha mãe.

Bons tempos. Não me arrependo de nada.

(Imagens gentilmente cedidas por Lenimar Andrade.)