sábado, setembro 18, 2004

O primeiro solo de Paul Simon


(Texto escrito originalmente para o International Magazine, mas não chegou a ser publicado.)

Em 1965, o futuro da dupla nova-iorquina Simon & Garfunkel parecia incerto. O LP Wednesday Morning 3 A.M., lançado no ano anterior pela Columbia, havia sido bem recebido pela crítica, mas não estourou. Paul Simon guardava boas lembranças da noite de Londres, dos clubes folk onde já havia se apresentado outras vezes. Decidiu voltar à capital inglesa. "Em Nova Iorque eu era um garoto do Queens. Isso era ruim. Em Londres eu era um americano. Isso era bom." Assim, o compositor abandonou a Faculdade de Direito do Brooklyn e rumou para o outro lado do Atlântico. Com o apoio da amiga Judith Piepe, Simon teve suas músicas apresentadas no programa "Five to Ten", da BBC, por duas semanas. A resposta dos ouvintes foi surpreendente. Logo a CBS inglesa se interessou em contratar o músico para lançar um disco solo.

The Paul Simon Songbook continha doze faixas em que Simon se acompanhava sozinho ao violão. "The Sound of Silence" e "He Was My Brother" eram regravações de músicas já lançadas no LP da dupla. Das demais, "A Church is Burning" e "The Side of a Hill" são as únicas que não reapareceriam em discos de Simon & Garfunkel, embora uma gravação ao vivo da primeira tenha sido incluída como raridade na caixa Old Friends, de 1997. "Kathy's Song" foi a composição que menos mudou em sua futura versão, mantendo o arranjo solo com Paul Simon ao entrar no LP com Garfunkel intitulado Sounds of Silence. Já "A Simple Desultory Philippic" sofreu uma transformação drástica em sua segunda encarnação. A versão original era uma paródia ao Bob Dylan acústico, enquanto a regravação do álbum Parsley, Sage, Rosemary and Thyme foi atualizada para o Dylan elétrico. Também a letra e a melodia tiveram alterações, de forma que se tornou praticamente uma nova composição. De resto, o "jogo das diferenças" em comparação aos discos da dupla se resume ao acréscimo da voz de Garfunkel em dueto ou substituição no solo, além de guitarra, baixo e bateria. Mas as versões cruas de Paul Simon tinham aquele vigor típico das interpretações autorais, especialmente em "Leaves That Are Green", "A Most Peculiar Man", "The Side of a Hill" e "Flowers Never Bend With The Rainfall". A moça que aparecia na capa do disco com Simon era Kathy, ex-namorada e musa de pelo menos dois clássicos de sua obra ("Kathy's Song" e "America").

Enquanto isso, nos Estados Unidos, o produtor Tom Wilson teve uma idéia brilhante. Pegou a gravação original de "The Sound of Silence", de Simon & Garfunkel, e, sem pedir autorização, acrescentou guitarra, baixo e bateria e lançou em single. Resultado: chegou ao primeiro lugar nas paradas americanas. Agora a dupla estava em demanda e foi chamada às pressas para gravar um segundo LP. O resto é história. Com isso, a carreira solo de Paul Simon na Inglaterra foi abandonada. The Paul Simon Songbook nunca foi lançado em vinil no mercado americano e logo saiu de catálogo também no Reino Unido, tornando-se um cobiçado item de colecionador. Só agora, finalmente, o primeiro disco solo de Paul Simon está sendo resgatado em CD, pelo selo Columbia/Legacy. Além das 12 faixas originais, o relançamento inclui também versões alternativas de "I Am a Rock" e "A Church is Burning" como bônus. Não deixa de ser irônico que, justo quando a dupla Simon & Garfunkel está de volta mais uma vez e excursionando com ingressos a peso de ouro, a obra de Paul Simon como solista esteja sendo valorizada. Além deste CD, está saindo também a caixa Studio Recordings 1972-2000, com mais nove álbuns-solo acrescidos de faixas-bônus.