sexta-feira, junho 03, 2005

Refeições comentadas

Não sei se é mania de gordo ou intolerância, mesmo, mas detesto fazer o que eu chamo de refeições comentadas. Em outras palavras, agüentar alguém fazendo observações sobre o que eu estou comendo ou deixando de comer no almoço ou na janta. Sei que minha alimentação não é balanceada e não preciso que um chato venha me avisar isso bem na hora de comer. Eu não fico olhado para o prato dos outros enquanto almoço.

- Puxa, você não come nada de verduras?

Pior é quando a pergunta ou a observação se torna repetitiva. Na primeira você responde, na segunda você conta até dez, na terceira você bufa e na quarta... Enquanto isso, na mesma mesa, alguém está comendo a mesma quantidade de carne, farinhas e gorduras, apenas engrossando a porção com alguns tomates e alfaces para dizer que sua refeição é equilibrada.

Eu sei que tenho manias. Talvez tenha faltado rigor dos meus pais nesse quesito, já que eu era filho temporão e eles já não tinham a mesma energia, mas desde a infância eu divido os alimentos em três tipos: os que me apetecem, os que eu como sem muito entusiasmo e os que me repulsam. E o fato de eu não gostar de arroz me torna uma aberração da natureza aos olhos dos outros. Vêm aquelas perguntas inteligentíssimas:

- Você não come arroz? Mas então o que você come com o feijão?

Normalmente eu procuro desconversar, pois se eu der a resposta certa, terei que escutar outra pérola. A resposta certa seria:

- Eu raramente como feijão.

E a pérola:

- Então você come o quê?

Eu mereço! Um colega meu ouviu essa mesma pergunta quando foi à Itália visitar parentes e comentou que não gostava de massa. Se um dia alguém me disser que não gosta de torradinhas eu vou perguntar no que a pessoa em questão passa o caviar. No caso, adoro misturar feijão com batata palha, polenta frita ou, na falta desses, até batata frita comum. Também gosto de colocar por cima do bife à milanesa e depois limpar o caldo do prato com pão. Com farofa também fica bom. Mas o ideal é comer sozinho ou com alguém que já me conheça, senão vêm os comentários de novo:

- Feijão com polenta? Que estranho...

E ficam olhando demoradamente, com aquela mesma cara interessada com que se deliciam com um carro acidentado ou algum caso bem escabroso no programa do Ratinho. Sobre o fato de eu não comer arroz, de vez em quando alguém diz, com cara de detetive esperto que desmascarou o mordomo:

- Já sei! É porque engorda!

Claro! Brilhante dedução! Para fugir às calorias do arroz, eu o substituo por aquelas frituras todas que citei. Parabéns pelo raciocínio lógico, Sherlock! Outra mania que eu tenho que atrai comentários inteligentes, oportunos e sempre bem-vindos é a de beber refrigerantes "diet" ou "light". Muita gente já veio me dizer que eu sou gordo por tomar muita Pepsi Light (que alívio, eu pensei que fosse por causa da massa e da carne gorda!). Outros olham para o meu prato e debocham:

- Comendo esse monte de massa e tomando Pepsi Light!

Eu poderia tentar explicar que o fato de a soma calórica ser grande no prato não me obriga a dobrar o valor no copo. Ou que os refrigerantes "diet" me descem rápido e fácil enquanto um só copo do refrigerante comum me faz sentir inchado, como se eu tivesse bebido chumbo. Ou ainda que o fato de eu estar mantendo a forma (literalmente) não significa que eu não me importe em aumentá-la ainda mais. Em outras palavras, que ainda é melhor ter 100 quilos do que 200. Mas não adianta. Quem é burro e inconveniente a ponto de fazer um comentário desses não vai entender um raciocínio matemático, por mais simples que seja. Dai-me paciência!

Agora com licença, que eu vou até ali comer uma picanha gorda com feijão, polenta frita e Pepsi Light e já volto.