A crise dos 20 e poucos
Eu mesmo passei por isso. Lembro das brigas com meus pais, eles querendo me abrir os olhos para o fato de que eu era temporão e iria perdê-los bem cedo. A verdade é que, após 20 anos de casa, comida e roupa lavada, fica a impressão de que tudo acontece de forma automática. A comida surge na mesa duas vezes por dia, as roupas deixadas no chão reaparecem no armário limpas e passadas e a bagunça do quarto se ajeita sozinha da manhã para a tarde. À noite, a cama estará arrumada. Acostumamo-nos que isso acontece dia após dia, tão certo quanto o sol estará brilhando de manhã e cairá à tardinha.
Até que um dia lá vêm os pais encher o saco com aquela conversa de trabalho. Que está na hora de assumir a independência, pensar no futuro, fazer uma faculdade e conseguir um emprego. Enquanto isso, a comida continua aparecendo na mesa nas horas certas. Talvez valesse a pena ter um pouco mais de dinheiro para o supérfluo, mas o essencial continua ali, como se caísse do céu todos os dias. Outros enfrentam problemas cada vez mais comuns, como a separação dos pais e conseqüente necessidade de contribuir para a caixinha da casa. Aí, sentem-se revoltados, onde já se viu, eu, Fulaninha, que só tenho 21 aninhos, trabalhando? Como ousam cometer esse crime contra a minha juventude? Que culpa tenho eu dos rolos dos meus pais?
Crescer é difícil. Eu próprio, aos 44 anos, ainda me pego esquecendo que a roupa que cai no chão não irá reaparecer automaticamente no armário limpa e passada. Mas agradeço aos meus pais o empurrão em direção à independência financeira. Hoje ouço histórias de amigos e colegas e seus marmanjos de 20 e poucos anos que não sabem se saem para revolucionar o mundo ou compram uma bicicleta. Uns ainda dependem financeiramente de seus pais, outros se revoltam por ter que trabalhar. A maioria ainda não se deu conta de que, um dia, eles mesmos terão que aprender aquela mágica que faz surgir comida na mesa duas vezes por dia. E quanto antes começarem a ensaiar o truque, melhor para todos.
1 Comments:
força!
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