A terceira caixa de David Bowie
Pois agora é a vez do terceiro volume, de nome A New Career in a New Town, que vai de 1977 a 1982. Como nos outros dois, o título de uma música de Bowie foi escolhido para batizar o conjunto de álbuns relançados. O cantor passou a maior parte do período em Berlin, por isso "uma nova carreira em uma nova cidade". Isso já deixa os fãs curiosos, fazendo especulações de como se chamará a próxima caixa. Muitos apostam em "Dancing With the Big Boys", outros em "Loving the Alien" ou talvez "Shinin' Star".
Uma curiosidade: a faixa-título teve versões em alemão e francês, em edições longas e curtas, e esta é a primeira vez em que todas (em especial, a gravação em francês) estão saindo em CD.
Como já era de se esperar, pelo que tinha sido feito com David Live na segunda caixa, o álbum duplo ao vivo Stage foi incluído em duas versões: a original da RCA de 1978 e a remixagem de 2005, com as músicas na ordem em que foram apresentadas no show. A segunda era a configuração ideal desse excelente registro da turnê de Bowie na época. Desde seu lançamento original, Stage já teve o acréscimo de cinco músicas em relançamentos posteriores: "Alabama Song" (versão da Rykodisc de 1991), "Be My Wife", "Stay" (ambas da edição de 2005) e agora, nesta caixa, "The Jean Genie" e "Suffragette City". As faixas originais do álbum Ziggy Stardust (1972) foram descaracterizadas pelos arranjos com muito teclado e pouca guitarra, mas as demais estão primorosas. Aqui está a versão definitiva de "Heroes" e releituras interessantes de 'What in the World", "Breaking Glass" e a instrumental "Speed of Life", num andamento acelerado, com mais swing.
Quando se soube que o pacote conteria uma versão do álbum Lodger, de 1979, remixada por Tony Visconti (além da mixagem original), a primeira impressão foi de que era algo arbitrário e sem necessidade, apenas para criar uma novidade. Pois, em um dos textos do livreto, Tony explica que, na época, tiveram que usar o Estúdio D de Record Plant para mixar o álbum e o equipamento em questão não era o melhor para a tarefa. Ele e Bowie não ficaram satisfeitos com o resultado e sempre sonhavam em fazer uma nova e definitiva mixagem do álbum. Pois agora ela está aqui. E Bowie acompanhou e aprovou o começo do processo, escutando os primeiros resultados. Quanto ao disco em si, é considerado o último da chamada "trilogia de Berlim", formada por Low, "Heroes" e Lodger. Nem tudo foi gravado na Alemanha, mas é uma referência ao período em que Bowie morou lá e a influência que o país teve em seu trabalho. Em Lodger, descartam-se os temas instrumentais e Bowie começa, aos poucos, a flertar novamente com o rock. Mas a volta do roqueiro só aconteceria de forma plena no álbum seguinte.
Scary Monsters (and Super Creeps), de 1980, foi um disco tão marcante que, a partir daí, sempre que a crítica quisesse elogiar um novo álbum de Bowie, apelava para o clichê: "seu melhor trabalho desde Scary Monsters". Para quem era fã dos velhos tempos de Ziggy Stardust e Aladdin Sane, foi gratificante ouvir novamente David Bowie mandando ver o bom e verdadeiro rock and roll, agora em sintonia com a chamada new wave. "Ashes to Ashes" rodou bastante nas rádios brasileiras. Em "Scream Like a Baby", ouvem-se acordes pesados como havia tempos não apareciam numa gravação de Bowie (depois ficou-se sabendo que a composição era original de 1973, o que explica a sensação de volta à antiga forma). "Scary Monsters" e "Because You're Young" também são rocks incendiários. Ao adentrar a nova década reafirmando sua posição de roqueiro-mor de sua geração (inclusive resgatando a imagem glitter no visual da capa), Bowie deixou a todos curiosos sobre o que viria nos anos seguintes. Ninguém poderia imaginar a nova guinada de estilo em 1983, que revitalizaria como nunca sua popularidade. Mas isso é assunto para a próxima caixa.
Scary Monsters foi o último álbum de Bowie para a RCA, mas não o último disco. Em 1982 ele lançou a trilha sonora da peça Baal, de Bertold Brecht, que ele estrelou numa encenação para a BBC. Com apenas cinco faixas, o disco foi considerado um EP (Extended Player), confeccionado em edições de 10 e 12 polegadas. Nunca teve um relançamento só dele em CD, mas agora aparece na íntegra na coletânea de raridades da caixa, Re:Call 3 (as faixas "Baal's Hymn" e "The Drowned Girl" já tinham saído no box de quatro CDs Sound+Vision). Bowie canta as músicas com sua voz crua, sem qualquer impostação. Outras faixas raras da caixa incluem versões mais curtas de single (ou mais longa, no caso de "Breaking Glass"), o tema instrumental "Crystal Japan", "Under Pressure" com o Queen e o dueto de Natal com Bing Crosby, "Peace on Earth/Little Drummer Boy". Como nos dois volumes anteriores, ficaram de fora faixas-bônus dos relançamentos da Rykodisc, como "Some Are", "Abdulmajid", "I Pray Olé" e a regravação de 1988 de "Look Back in Anger". Ganha-se de um lado, perde-se de outro.
O livreto de capa dura que acompanha o lançamento contém fotos promocionais diversas, reproduções miniaturizadas das capas (inclusive dos singles), críticas e matérias publicadas nas épocas respectivas e textos atuais do produtor Tony Visconti explicando como foram gravados os álbuns de estúdio. Uma curiosidade que é ignorada - por razões contratuais, talvez? - é que várias dessas músicas foram utilizadas no filme "Christiane F.", onde inclusive Bowie faz uma ponta numa cena de show. Desde que ouvi Low e depois "Heroes", sempre achei que as gravações instrumentais daqueles LPs seriam perfeitas para uma trilha sonora. Pois isso foi confirmado na prática.
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